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Peita dá visibilidade ao movimento de mulheres indígenas

por | out 20, 2019 | Cultura

Como é a luta das mulheres dentro das aldeias? Como é para elas saberem que suas terras foram invadidas por genocídas europeus que dizimaram 90%* da população original do Brasil em menos de 100 anos de escravidão e assassinatos? Como é proteger reservas ambientais, bens da humanidade e não ter seus esforços reconhecidos? Como é ter pessoas tentando enfiar goela abaixo uma cultura e um sistema que você não quer? Em outubro e novembro, a PEITA vai trazer histórias de mulheres invisíveis aos olhos coloniais, mas que tem papéis de liderança e militância dentro de suas comunidades. O primeiro vídeo é com a caciqua Juliana Kerexu Mirim Mariano, da aldeia Tekoa Takuaty, em Paranaguá e será divulgado dia 15 de outubro.

E não é só isso, a marca-protesto está lançando a frase ‘Lute como uma garota.’ na versão guarani, com o parte do lucro revertido para o Movimento Jera Rete, organizado pela Eliane e Jéssica Gabriel de Castro, da Aldeia Kuaray Haxa (Guaraqueçaba), que leva informações sobre os direitos de acesso à saúde, demarcação de terras, educação, além de debater sobre violência contra a mulher em aldeias do Paraná. Também será lançada uma peita com a escrita em kaingang e seu lucro será destinado a construção do refeitório das crianças da Aldeia Kakane Porã, localizada na periferia de Curitiba.

( • ) NHANEMBARAETE XONDARIA KUERY

A proposta de fazer vídeos para dar visibilidade a causa e ceder o lucro surgiu após a PEITA ser convidada a participar do primeiro encontro do Movimento Jera Rete em julho deste ano, na Aldeia Palmeirinha, no município de Chopinzinho. “O movimento foi criado para ajudar mulheres indígenas que não sabem dos seus direitos e que estão esquecidas em aldeias distantes. Para nós, é importante levar essas informações para que elas saibam o que exigir e como se defender de violências, discriminações e machismo”, explica Eliane.

O Movimento Jera Rete já tem o segundo encontro agendado para janeiro de 2020, na cidade de Laranjeiras, onde duas aldeias irão participar, promovendo ainda a união entre elas. Segundo a Eline, desta vez serão dois dias de atividades: um para as rodas de conversa e outro para um jogo amistoso de futebol com o time feminino local.

Sobre a parceria, Eliane diz que foi Nhanderú que cruzou os caminhos. “A luta da PEITA é a mesma que é nossa. Nós somos indígenas e mulheres e elas são mulheres, a gente luta pelos mesmos direitos. Juntas temos mais força. A divulgação vai ajudar o nosso movimento a ser reconhecido”, comenta.  

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No começo de 2019 a presidenta da PEITA, Karina Gallon, fez um curso de política para mulheres que contemplou pessoas de todo o Brasil. Nele, ela conheceu a Camila dos Santos e Silva que mora na Aldeia Kakane Porã, considerada a segunda aldeia urbana do Brasil, termo que Camila já avisa que não gosta pois “aldeia é aldeia”. Lá moram 38 famílias.

No centro do terreno foi construída uma oca que inicialmente seria destinada a atividades culturais, mas a comunidade sentiu a necessidade de uma escola que ensinasse guarani e kaingang para crianças e adultos. Como instituição de ensino, o espaço recebe merenda do Secretaria de Estado da Educação do Paraná, mas por não ter um refeitório com cozinha, despensa, mesas e cadeiras, recebeu ameaça de corte dos suprimentos.

“Sem a demarcação a gente não tem o básico que a Constituição de 1988 nos garante: saúde e educação diferenciada para os povos indígenas. Não é porque moramos num território urbano que não precisamos disso. Essa parceria é muito importante porque vamos conseguir realizar algo fundamental na minha aldeia: construir um espaço para que a merenda não acabe”, ressalta Camila.

As paredes foram levantadas, mas ainda faltam janelas, portas, forro, piso, instalação elétrica e encanamento de água. Assim que estiverem com a estrutura pronta, a SEED fornecerá os eletrodomésticos necessários.

( • ) VÍDEOS

A partir do dia 15 de outubro, durante seis sextas-feiras, a PEITA lançará um vídeo por semana com o relato de mulheres que lutam por suas comunidades. Neste primeiro, quem fala é a caciqua Juliana Kerexu da Tekoa Takuaty. Também participam Camila Santos e Silva e Rosane Salete Rodrigues da Kakane Porã, Eliane e Jéssica Gabriel de Castro da Kuaray Haxa e  Myrian Krexu, uma das primeiras médicas indígenas a se formar no Brasil. A ordem dos vídeos foi definida de acordo com a disponibilidade de cada uma.

“Eu tento imaginar como é alguém entrando na minha casa e dizendo que tudo que tem ali é amaldiçoado, que a maneira que eu me visto é errada, que meu comportamento será repreendido e que os valores que eu aprendi e carrego por gerações justificam escravizar e dizimar minha família. Quando penso nisso vejo a herança colonizadora que eu carrego, que só matou, roubou e destruiu. Foi o que fizemos com os povos originários do Brasil e eu entendo que sou parte disso. Dar espaço e visibilidade para a fala das mulheres indígenas é o mínimo que eu posso fazer como branca. É me colocar no lugar de escuta, de solidariedade e auxiliadora para que essa reapropriação do espaço aconteça”, comenta Karina Gallon, idealizadora e presidenta da PEITA.  

A captação dos vídeos foi realizada pelo Projeto Origem, composto por fotógrafas e fotógrafos que buscam mostrar ao mundo as comunidades indígenas do Sul do Brasil.

Assista ao vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=PBNNHJsQWy8&t=4s   

 

Ficha técnica

Direção: Karina Gallon

Produção: Luana Angreves 

Co-produção: Bruna Kamaroski e Nathalia Sibuya.

Cinegrafista: Tamiris Tertuliano, Bruna Kamaroski e Luana Angreves.

Edição: Sofia Suplicy

Áudio: Toro Criative Áudio

Apoio: Projeto Origem

 

Fotos: Bruna Kamaroski e Patrícia Carvalho.

 

*Dado retirado do livro Calibã e a Bruxa, de Silvia Federici, sobre o genocídio na América Latina.

 

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